As chuvas acumuladas entre outubro de 2024 e março de 2025 reduziram a intensidade de seca em parte das regiões Norte e Centro-Oeste. Contudo, persistem áreas em condições de seca até o final do mês de março. De acordo com o Índice Integrado de Seca (IIS), o número de municípios em situação de seca moderada e extrema caiu de 2.954 em outubro de 2024, para 1.907 em março de 2025. Os municípios nestas condições agora estão concentrados, em sua maioria, na região centro-sul do país. Os dados constam da nota técnica produzida pelo Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), unidade de vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), a partir de dados primários de diferentes instituições oficiais. O material foi publicado nesta segunda-feira (7).
O monitoramento da propagação da seca em março de 2025 indica que a maior parte da região centro-sul está em estágio de atenção, indicado na cor laranja. A situação de atenção é definida pelo índice de chuva (Índice Padronizado de Precipitação – SPI) e a umidade do solo estão em níveis críticos, indicando início das condições de seca.
Cerca de 1,1 milhão de km2 em estado de alerta, o que equivale a 13% do território nacional está em estado de alerta, indicadas na cor vermelha. As áreas concentram-se nas regiões Sudeste, Sul e na Bahia. Elas são resultado da combinação do déficit de precipitação e estresse da vegetação, indicando um estágio mais avançado da seca, com potenciais impactos na agricultura, pastagens e ecossistemas naturais. “Em relação à seca de 2023-2024, hoje temos um cenário da seca mais deslocada para a direita do território, atingindo mais o Brasil central e parte do Nordeste”, explica a coordenadora do monitoramento de secas e pesquisadora do Cemaden, Ana Paula Cunha.
Situação crítica na bacia do rio Paraguai – A nota técnica lembra que os anos de 2023 e 2024 foram marcados por seca extensa e intensa que atingiu cerca de 60% do território nacional. As chuvas durante dos últimos seis meses, estação chuvosa em boa parte do território, foram suficientes para reduzir a intensidade da seca hidrológica em várias bacias hidrográficas, que passaram da condição de seca extrema e excepcional para uma condição de seca moderada ou até normalidade em algumas delas.
A melhora é mais visível nas bacias hidrográficas da região Sudeste, Centro-Oeste e Norte, que alimentam importantes reservatórios de usinas hidrelétricas, como as localizadas nas bacias dos rios São Francisco, Madeira, Xingu, Tocantins-Araguaia e nas cabeceiras do rio Paraná.
Contudo, segundo a nota, a bacia do rio Paraguai, na região Centro-Oeste, continua enfrentando uma situação hídrica “extremamente crítica”. Entre fevereiro e março de 2025, os níveis dos rios apresentaram recuperação gradual, contudo permanecem abaixo da média histórica (período 1981-2023). A nota explica que as chuvas não foram suficientes para mitigar as condições de seca devido ao significativo déficit hídrico acumulado no solo. Isso retarda o processo de recarga dos corpos d’água e, consequentemente, a elevação das vazões.
Segundo o pesquisador em meteorologia do Cemaden, Giovanni Dollif, alguns estudos recentes têm indicado que o aquecimento anômalo, ou seja, acima dos padrões normais, do Oceano Atlântico Tropical Norte pode estar contribuindo para a recorrência de movimentos subsidentes – que são fluxos de ar de cima para baixo – associados a áreas de alta pressão, sobre a região central do Brasil, incluindo o bioma Pantanal. “Esse fenômeno desfavorece a formação de chuvas, resultando no encurtamento ou até mesmo na interrupção precoce da estação chuvosa”, afirma o pesquisador.
No rio Paraguai, os níveis nas estações fluviométricas de Ladário e Porto Murtinho, ambas no Mato Grosso do Sul, encerraram a estação chuvosa com valores de cerca de 40% abaixo da média histórica para o mês de março. A situação é considerada ‘particularmente grave’ por apresentar secada de intensidade excepcional, a mais alta no ranking.
A situação crítica também é verificada na porção baixa da bacia do rio Paraná, onde também persiste um déficit de chuvas nos últimos 24 meses, conforme indicado pelo Índice Padronizado de Precipitação (SPI) para 24 meses. No trecho entre as usinas hidrelétricas de Porto Primavera (SP) e Itaipu (PR), também permanece em situação crítica, com seca hidrológica variando entre intensidade extrema e excepcional.
A bacia do rio Paraná é uma das bacias com maior potencial hidroelétrico do país. De acordo com a nota, a seca prolongada tem provocado uma “drástica redução nas vazões dos rios” que alimentam Itaipu. No ano passado, houve seis quebras de recordes mínimos de vazão durante o ano de 2024 e o cenário se repete em março de 2025, com vazão abaixo do mínimo registrado em 2024. A nota destaca que a situação evidencia “a gravidade e a continuidade da crise hídrica nesta porção da bacia, com impactos diretos na geração de energia e na estabilidade do sistema hidrelétrico”.
Alguns municípios de Bahia, Sergipe e Alagoas registraram entre 170 e 180 dias sem chuva. O norte de Minas Gerais e o Rio Grande do Sul também apresentam períodos longos sem chuvas.
Na região Sul houve inversão das condições. Em setembro de 2024 as condições hidrológicas estavam normais e em março deste ano passaram à seca. A mudança é parcialmente explicada pela influência das condições de La Niña, que altera os padrões de precipitação na região.
“Choveu abaixo da média principalmente na porção oeste do estado, região que costuma receber influência da La Nina. Embora tenha sido uma La Niña fraca, pode ter influenciado as chuvas abaixo da média entre novembro e janeiro”, explica pesquisadora Ana Paula Cunha, que coordena o monitor de secas do Cemaden.
Na região Norte, a maioria dos rios monitorados pela Agência Nacional de Águas (ANA) apresenta níveis superiores à média histórica. Segundo a pesquisadora em hidrologia do Cemaden, Adriada Cuartas, “praticamente toda a região Norte está em uma situação melhor”. As exceções são os rios Juruá na estação de Itamarati (AM) e o rio Amazonas na estação de Itacoatiara (AM). Mas o cenário para esses dois pontos deverá mudar em abril. “Vai receber toda a água do rio Madeira”, afirma. Depois de passar pela pior seca desde 1967, segundo o Serviço Geológico Brasileiro (SGB), o rio está em processo de cheia e se aproxima da cota de inundação, de 17 metros, para a capital de Rondônia.
Ondas de calor – O documento destaca que a ocorrência de ondas de calor se sobrepôs geograficamente às regiões mais afetadas pela seca. A sobreposição amplia os impactos ambientais e socioeconômicos, especialmente na saúde pública, na produção agropecuária e na segurança hídrica.
Impactos em áreas agroprodutivas – O documento avalia os impactos da seca nas atividades agrícolas e pastagens para o período analisado. As regiões Sul e Sudeste apresentaram aumento crescente nos meses de fevereiro e março de 2025 das áreas agroprodutivas potencialmente impactadas. A nota destaca que os impactos devem ser mais severos na produção pecuária, pois as pastagens poderão apresentar baixa qualidade devido ao prolongado déficit hídrico e à baixa umidade do solo.
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